Nutrigenética e Infertilidade: novas tecnologias

nutrigenetica e infertilidade

A relação entre infertilidade e nutrigenética é um campo de pesquisa que investiga como a genética de um indivíduo pode influenciar sua resposta a nutrientes e, consequentemente, sua saúde reprodutiva. 

A infertilidade é caracterizada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pelo Comitê Internacional de Monitoramento das Tecnologias de Reprodução Assistida (ICMART) como uma doença do sistema reprodutor, definida pela incapacidade de engravidar após pelo menos 12 meses de relações sexuais regulares e desprotegidas.

Segundo um relatório publicado pela Organização Mundial da Saúde, com base em dados de 1990 a 2021, a infertilidade é um problema de saúde pública que afeta aproximadamente 17,5% da população adulta, sendo que um em cada seis indivíduos no mundo sofre de subfertilidade ao longo da vida, afetando cerca de 50 milhões de casais em todo o mundo.

Em relação às causas da infertilidade, 20–35% dos diagnósticos são atribuídos a causas fisiológicas nas mulheres, aproximadamente 20–30% nos homens. Neste artigo vamos falar alguns pontos chaves da nutrigenética que pode estar lhe ajudando no seu tratamento de fertilidade.

Influência Genética na Nutrição

Nutrientes Essenciais

  • Genes e Ácido Fólico
  • Genes e Calcio
  • Genes e Ferro
  • Genes e Selênio
  • Genes e Zinco
  • Genes e Vitamina E

Saúde Metabólica

Efeitos das Dietas

Considerações Finais

Influência Genética na Nutrição

O alimento é vital para todas as criaturas extrairem energia e realizarem todos os processos essenciais, como a reprodução. Os nutrientes são essenciais para todos os estágios de desenvolvimento em humanos, incluindo crescimento, puberdade e reprodução. A nutrigenética examina como variações genéticas em genes relacionados ao metabolismo e à absorção de nutrientes podem afetar a fertilidade. Fatores nutricionais desempenham um papel fundamental na determinação da saúde reprodutiva e podem influenciar positiva ou negativamente a fertilidade em humanos.

Por exemplo, algumas pessoas podem ter variantes que influenciam a maneira como metabolizam vitaminas e minerais essenciais para a saúde reprodutiva. Alguns micronutrientes e suplementos alimentares, como ácido fólico, cálcio, zinco, selênio, antioxidantes, ferro e vitaminas D, B12, E e C, têm um efeito potencial na saúde dos sistemas reprodutivos masculino e feminino, especialmente em mulheres grávidas. 

As tecnologias ômicas elucidam como a dieta e nutrientes definidos interagem com genes, proteínas e metabólitos e afetam os fenótipos metabólicos e as consequências das doenças.

Nutrientes Essenciais

Nutrientes como ácido fólico, zinco, vitamina D e ácidos graxos ômega-3 têm um papel importante na saúde reprodutiva. A forma como uma pessoa metaboliza esses nutrientes pode impactar sua fertilidade. Por exemplo, algumas variações genéticas podem afetar a capacidade de metabolizar o ácido fólico, o que é crucial para a saúde do esperma e do óvulo.

O potencial de fertilidade masculina é clinicamente examinado pela análise do sêmen. Há uma ampla gama de macronutrientes e micronutrientes, como galactose, frutose, aminoácidos, zinco, potássio, magnésio e vitamina C, que formam os componentes do sêmen. A capacidade do sêmen de fertilizar o óvulo feminino depende de fatores importantes, incluindo a qualidade e a quantidade do esperma.

Tabela 1: Descrição, papel e desempenho dos micronutrientes essenciais. seu impacto na saúde reprodutiva feminina e masculina, e genes relacionados.

MicronutrienteDescriçãoEfeito na mulherEfeito no sexo masculinoDose Consequências da deficiênciaFontesGenes relacionados
Ácido fólicoConhecida como vitamina B9Composto essencial envolvido em processos bioquímicos importantesMelhora as chances de gravidezReduz o risco de infertilidade ovulatóriaFornece carbono para síntese e metilação de DNACrítico para a espermatogênese400 μg/diaParto prematuroCrescimento intrauterino reduzidoAumenta o risco de deficiências congênitas associadas ao diabetesVegetais, frutas, nozes, frutos do mar, ovos, laticínios, carneBHMT, FOLR1, FOLR2, MTHFD1, MTHFR, SHMT1
CálcioDesempenha um papel na saúde reprodutivaFacilita a fertilizaçãoCria um ambiente alcalino na vaginaProdução folicularAtivação e maturação do ovócitoRegula a motilidade dos espermatozoides1 g/diaDistúrbios hipertensivos da gravidezOsteopenia, parestesiaCãibras musculares, tétanoCrescimento fetal atrasadoMineralização no fetoLaticínios, repolho, couve, brócolis, amêndoas, tofu, sardinhas com espinhasCASR, VDR, CYP24A1, CYP2R1, GATA3
FerroManutenção de glóbulos vermelhos saudáveisTransporte de oxigênio no sangueFunção imunológicaHomeostase dos radicais livresAuxilia no processo de implantação do óvulo fertilizadoEssencial para ejacular fluidezMantém o pH do espermaFontes de ferritina, que protege o tecido testicularesperma em desenvolvimento30–60 mg/diaRisco de parto prematuroDiminuição das defesas contra infecçõesDesenvolvimento psicomotor anormal e comprometimento cognitivo na infânciaFeijões, vegetais, cereais, pãesHFE, NOS3, TF, TFR2, TMPRSS6
SelênioSelenoproteínaDesempenha um papel potencial na fertilidade feminina e masculinaDesenvolvimento da placentaDesenvolvimento adequado do sistema nervoso do fetoMantém a integridade e viabilidade dos espermatozoidesProtege-os contra danos oxidativos60 µg/diaAumenta o risco de complicações na gravidezRestrição do crescimento fetalAumenta o hormônio tireoidianoAltera a função placentáriaNozes, frutos do mar, peixes, camarões, carnes magras, cereais, laticíniosSELENOF, SELENOP, GPX1, GPX4, TXNRD2
ZincoDesempenha um papel fundamental na fertilidade tanto feminina quanto masculinaTem maior importância para os homensEnvolvido na capacitação e fertilização no trato reprodutivo femininoSíntese de testosteronaViabilidade do espermaDesenvolvimento dos testículos20 mg/diaParto prematuroNatimortoDefeitos do tubo neural fetalRestrição do crescimento fetalOstras, ovos, carne vermelha, aves, frutos do mar, feijões, nozes, grãos, laticíniosSLC30A1, SLC39A6, MT1A, GPX1, ACE
Vitamina EUm antioxidante vital na membrana celularSuporta funções reprodutivasParticipa da implantação do óvulo fertilizado e do desenvolvimento da placentaApoia a função reprodutiva em homensAumenta a qualidade e a quantidade do esperma22–30 mg/diaEnvelhecimento placentárioLesão endotelial vascularDistúrbios da gravidezDescolamento prematuro da placentaAbortoParto prematuroNozes, sementes, óleos vegetais, vegetais de folhas verdes, cereais fortificadosABCG2, TTPA, CYP4F2, SEC14L2, FADS

Genes e Ácido Fólico

  1. BHMT (Betaine-Homocysteine Methyltransferase): O gene BHMT codifica uma enzima que catalisa a conversão de homocisteína em metionina utilizando betaína como doador de metila. Este processo é parte do ciclo de metilação, que está relacionado ao metabolismo do ácido fólico, já que a metionina é um produto importante da via de metilação que também envolve o ácido fólico.
  2. FOLR1 (Folate Receptor 1): O gene FOLR1 codifica o Receptor de Folato 1, que é responsável pela captação de ácido fólico e folatos na forma de poliglutamato nas células. Este receptor é crucial para garantir que as células recebam quantidades adequadas de folato, essencial para a síntese de DNA e o crescimento celular.
  3. FOLR2 (Folate Receptor 2): Semelhante ao FOLR1, o gene FOLR2 também codifica um receptor de folato, mas tem um papel ligeiramente diferente e é expresso em diferentes tecidos. A função do FOLR2 na captação de folato é importante para processos como a proliferação celular e a manutenção da saúde.
  4. MTHFD1 (Methylenetetrahydrofolate Dehydrogenase 1): O gene MTHFD1 codifica uma enzima envolvida nas vias de metabolismo do ácido fólico, especificamente na conversão de 5,10-metilenotetrahidrofolato em 5-metiltetrahidrofolato, que é a forma ativa do folato utilizada em reações de metilação.
  5. MTHFR (Methylenetetrahydrofolate Reductase): O gene MTHFR é crucial para a conversão de 5,10-metilenotetrahidrofolato em 5-metiltetrahidrofolato. Variantes genéticas neste gene, como C677T e A1298C, podem afetar a atividade da enzima e, consequentemente, a capacidade do corpo de metabolizar o ácido fólico e regular os níveis de homocisteína, o que pode ter implicações para a saúde cardiovascular e outros aspectos.
  6. SHMT1 (Serine Hydroxymethyltransferase 1): O gene SHMT1 codifica uma enzima que converte serina em glicina, um processo que também gera 5,10-metilenotetrahidrofolato. Este gene está envolvido na síntese de nucleotídeos e na produção de metila, ligando-se ao metabolismo do ácido fólico e à regulação da homocisteína.

Genes e Calcio

  1. CASR (Calcium-Sensing Receptor): Este gene codifica um receptor que detecta níveis de cálcio no sangue e regula a homeostase do cálcio no organismo. O CASR desempenha um papel crucial na regulação da secreção de paratormônio (PTH) e na absorção de cálcio pelos rins e intestinos.
  2. VDR (Vitamin D Receptor): O VDR é o receptor para a vitamina D, que é fundamental para a absorção de cálcio no intestino. A ativação do VDR pela forma ativa da vitamina D (calcitriol) aumenta a absorção intestinal de cálcio e fósforo.
  3. CYP24A1 (Cytochrome P450 Family 24 Subfamily A Member 1): Este gene codifica uma enzima que metaboliza a vitamina D, regulando os níveis de calcitriol no organismo. A função do CYP24A1 é importante para evitar a toxicidade da vitamina D e manter a homeostase do cálcio.
  4. CYP2R1 (Cytochrome P450 Family 2 Subfamily R Member 1): O CYP2R1 também está envolvido no metabolismo da vitamina D, convertendo a vitamina D em sua forma ativa. Esse processo é essencial para a regulação do cálcio e a saúde óssea.
  5. GATA3 (GATA Binding Protein 3): Embora seja mais conhecido por seu papel na regulação do desenvolvimento e função das células T, o GATA3 também está associado à regulação do metabolismo de cálcio e vitamina D, influenciando a expressão de genes relacionados à homeostase do cálcio.

Genes e Ferro

  1. HFE (High Iron Fe): O gene HFE está associado à regulação da absorção de ferro no intestino. Ele codifica uma proteína que interage com o receptor de transferrina e ajuda a regular os níveis de ferro no organismo. Variações no gene HFE estão frequentemente associadas à hemocromatose hereditária, uma condição que leva ao acúmulo excessivo de ferro no corpo.
  2. NOS3 (Nitric Oxide Synthase 3): O gene NOS3 codifica a enzima óxido nítrico sintase endotelial, que é envolvida na produção de óxido nítrico (NO). O NO desempenha um papel importante na regulação do fluxo sanguíneo e pode influenciar a absorção de ferro e a homeostase. Estudos sugerem que o NO pode afetar a liberação de ferro de macrófagos e a mobilização de ferro a partir de reservas.
  3. TF (Transferrin): O gene TF codifica a transferrina, uma proteína responsável pelo transporte de ferro no plasma. A transferrina se liga ao ferro e o transporta para células onde é necessário, como células do fígado e da medula óssea. Os níveis de transferrina podem ser indicativos do status de ferro no organismo.
  4. TFR2 (Transferrin Receptor 2): Este gene codifica um receptor que se liga à transferrina e facilita a captação de ferro pelas células. O TFR2 é importante para a regulação do metabolismo do ferro, especialmente em resposta a níveis elevados de ferro no organismo.
  5. TMPRSS6 (Transmembrane Protease, Serine 6): O gene TMPRSS6 é envolvido na regulação da produção de hepcidina, um hormônio que controla a absorção de ferro no intestino e a liberação de ferro pelos macrófagos. A hepcidina é crucial para a homeostase do ferro, e a mutação no TMPRSS6 pode levar a distúrbios na regulação do ferro, como anemia e hemocromatose.

Genes e Selênio

  1. SELENOF (Selenoprotein F): Este gene codifica uma selenoproteína envolvida no metabolismo do selênio. A proteína resultante desempenha um papel na proteção contra estresse oxidativo e na homeostase do selênio.
  2. SELENOP (Selenoprotein P): O SELENOP é uma selenoproteína que atua como um transportador de selênio no plasma. Ele é importante para a distribuição do selênio nos tecidos e desempenha um papel na defesa antioxidante.
  3. GPX1 (Glutathione Peroxidase 1): Este gene codifica uma enzima que utiliza selênio para neutralizar peróxidos e proteger as células contra o estresse oxidativo. É uma das principais enzimas antioxidantes que dependem de selênio.
  4. GPX4 (Glutathione Peroxidase 4): Assim como o GPX1, o GPX4 também é uma selenoproteína que desempenha um papel crucial na proteção celular contra o estresse oxidativo, especialmente em lipídios, prevenindo a peroxidação lipídica.
  5. TXNRD2 (Thioredoxin Reductase 2): Este gene codifica uma enzima que é parte do sistema de antioxidantes dependentes de selênio. A TXNRD2 desempenha um papel na manutenção do estado redox celular e na proteção contra estresse oxidativo.

Genes e Zinco

  1. SLC30A1 (Solute Carrier Family 30 Member 1): Este gene codifica uma proteína que atua como um transportador de zinco, facilitando a exportação de zinco das células. A regulação do transporte de zinco é crucial para a homeostase do zinco no organismo.
  2. SLC39A6 (Solute Carrier Family 39 Member 6): Este gene codifica um transportador de zinco que é responsável pela absorção de zinco nas células. Ele desempenha um papel importante na regulação dos níveis de zinco intracelular.
  3. MT1A (Metallothionein 1A): O gene MT1A codifica uma metalotioneína, que é uma proteína que se liga a metais pesados, incluindo zinco. As metalotioneínas ajudam a regular os níveis de zinco e protegem as células contra a toxicidade de metais.
  4. GPX1 (Glutathione Peroxidase 1): Embora seja mais conhecido por sua função como uma enzima antioxidante, o GPX1 também é dependente de zinco para sua atividade. Esse gene desempenha um papel importante na proteção contra estresse oxidativo.
  5. ACE (Angiotensin-Converting Enzyme): Este gene codifica uma enzima importante no sistema renina-angiotensina e está envolvido na regulação da pressão arterial. O zinco pode influenciar a atividade da ACE, e variações nesse gene podem impactar a homeostase do zinco.

Genes e Vitamina E

  1. ABCG2 (ATP-binding cassette sub-family G member 2): Este gene codifica uma proteína que atua como um transportador de lipídios e é envolvido na absorção intestinal da vitamina E. Variantes no gene ABCG2 podem afetar a eficiência da absorção da vitamina E.
  2. TTPA (Tocopherol Transfer Protein Alpha): O gene TTPA codifica a proteína de transferência de tocoferol, que é essencial para o transporte da vitamina E no plasma. Deficiências nesse gene podem levar a problemas na absorção e utilização da vitamina E, resultando em condições como a ataxia relacionada à deficiência de vitamina E.
  3. CYP4F2 (Cytochrome P450 Family 4 Subfamily F Member 2): Este gene está envolvido no metabolismo da vitamina E. Variantes no CYP4F2 podem influenciar os níveis de vitamina E no organismo, afetando sua biodisponibilidade e função.
  4. SEC14L2 (SEC14-like protein 2): Este gene está associado ao transporte de lipídios e pode desempenhar um papel na regulação dos níveis de vitamina E no corpo. A relação entre SEC14L2 e a vitamina E ainda está sendo estudada.
  5. FADS (Fatty Acid Desaturase): Embora não esteja diretamente ligado à vitamina E, os genes da família FADS, que estão envolvidos na biossíntese de ácidos graxos essenciais, podem influenciar os níveis de vitamina E, uma vez que a vitamina E é frequentemente encontrada em alimentos ricos em ácidos graxos.

Saúde Metabólica

A nutrigenética pode ajudar a entender como condições metabólicas, como resistência à insulina e obesidade, afetam a fertilidade. A predisposição genética a essas condições pode ser modulada pela dieta, influenciando a saúde reprodutiva.

A obesidade tem um impacto negativo na saúde dos sistemas reprodutivos masculino e feminino, e pessoas obesas sempre apresentam baixas taxas de fertilidade. Por esse motivo, a obesidade deve ser tratada imediatamente.

Efeitos das Dietas

Dietas personalizadas com base em perfis genéticos podem ajudar a otimizar a fertilidade. Por exemplo, uma dieta rica em antioxidantes pode ser benéfica para a saúde do esperma, e a identificação de genes associados à resposta a certos alimentos pode guiar escolhas dietéticas.

As isoflavonas têm um efeito negativo na fertilidade dos homens; no entanto, elas auxiliam a saúde sexual das mulheres na menopausa. O consumo de leite integral aumenta a fertilidade nas mulheres, mas para os homens, o mesmo benefício vem do consumo de leite desnatado.

Considerações Finais

A pesquisa sobre a conexão entre fertilidade e nutrigenética é promissora e pode levar a abordagens mais personalizadas para o tratamento da infertilidade. Profissionais de saúde que consideram tanto a genética quanto a nutrição podem ajudar indivíduos e casais a otimizar sua saúde reprodutiva, oferecendo recomendações dietéticas e intervenções que são adaptadas às suas necessidades específicas.

Referências

Ma X, Wu L, Wang Y, Han S, El-Dalatony MM, Feng F, Tao Z, Yu L, Wang Y. Diet and human reproductive system: Insight of omics approaches. Food Sci Nutr. 2022 Mar 21;10(5):1368-1384.

Monteiro J, Bicho M, Valente A. The Contribution of Precision Nutrition Intervention in Subfertile Couples. Nutrients. 2024 Dec 30;17(1):103. doi: 10.3390/nu17010103. PMID: 39796537; PMCID: PMC11722978.

GeneCards: The Human Gene Database. Disponível em: https://www.genecards.org/.

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